Quarenta anos depois das primeiras eleições livres em Portugal após a queda da ditadura, os valores da abstenção eleitoral não têm parado de aumentar. Passamos das longas filas para votar para taxas de abstenção enormes: 47,4% nas eleições autárquicas de 2013 e, máximo absoluto, 66,09% nas europeias de 2014. Jorge Miguéis, Director-Geral da Administração Eleitoral, afirma que estes números se devem ao facto de o recenseamento estar “relativamente empolado” pelo facto de muitos emigrantes manterem a sua residência e, por conseguinte, o seu recenseamento eleitoral em Portugal. Como se já não bastasse verem-se obrigados a seguir o que se passa no país à distância, os emigrantes são ainda tratados como prevaricadores, culpados pelo empolar da abstenção.
Sendo abusivo refugiar-se nos portugueses emigrados que mantêm o seu recenseamento em Portugal para justificar as taxas de abstenção, é essencial que se revejam os mecanismos de recenseamento e participação eleitoral da diáspora. Paralelamente, devem actualizar-se os cadernos eleitorais, de modo a que reflictam os verdadeiros valores de abstenção. A saída do país não se faz nunca de ânimo leve. A grande maioria dos mais de 100 mil portugueses que, a cada ano, tem deixado o país, fá-lo por não encontrar qualquer alternativa. O mínimo que o Estado deve fazer é facilitar a participação eleitoral dos portugueses residentes fora do país. Actualmente, é mais fácil fazer-se a alteração da morada – que pode ser feita em casa, através do portal do cidadão – que o recenseamento eleitoral, que obriga ao deslocamento ao Consulado, muitas vezes localizado a dezenas, quando não centenas de quilómetros de distância. Convém referir que a alteração da morada para o estrangeiro tem, como consequência imediata, a perda da capacidade eleitoral. Os emigrantes são pois automaticamente esquecidos, passados para uma segunda categoria de cidadãos.
Como se tudo isto não bastasse, a actual maioria parlamentar continua a dificultar ao máximo a participação dos emigrantes, criando, quando não já existentes, novas barreiras. Um exemplo claro é a eleição para o Conselho das Comunidades Portuguesas onde, contrariamente ao que aconteceu em eleições passadas, onde bastava a inscrição consular, passa a ser obrigatório o recenseamento eleitoral no estrangeiro. A consequência é clara: o colégio eleitoral é extremamente reduzido, afastando, uma vez mais, os portugueses da vida pública e política no estrangeiro. Um exemplo claro desta situação é o Reino Unido, onde estão inscritos nos Consulados 200 mil portugueses, dos quais apenas 900 estão recenseados. Tornam-se, portanto, irónicas as afirmações de Marco António Costa, que acusa a oposição de ter medo do voto dos emigrantes, quando é a maioria parlamentar da qual ele faz parte a tudo fazer para não permitir uma maior participação dos portugueses emigrados.
É necessária a revisão do modo como o recenseamento eleitoral é feito no estrangeiro. À semelhança do que acontece com a alteração da morada, o recenseamento eleitoral deve também poder ser feito através do portal do cidadão, não obrigando ao deslocamento ao Consulado. Devem também ser revistos os modos de votação dos emigrantes – actualmente por correspondência para as eleições legislativas e presencialmente para as restantes – devendo estudar-se a possibilidade do voto electrónico, em urna ou à distância. Finalmente, deve também ser feita uma revisão da lei, de modo a que os emigrantes possam optar por votar para os círculos da emigração ou para os seus círculos eleitorais em Portugal.