A Europa num tabuleiro de xadrez

Ao longo da História, a Grécia tem sido terreno fértil para o crescimento de grandes vultos. São inúmeros os gregos que se afirmaram como autoridades mundiais em áreas tão distintas como a filosofia e a matemática. No entanto, apesar de ter alguns grandes-mestres, nunca foi o país de origem de uma verdadeira referência mundial de xadrez. Até ontem. O pseudo-afastamento do ministro das finanças grego Yannis Varoufakis, que se vê agora na companhia de uma equipa de negociadores coordenada por Euclid Tsakalotos, ministro dos Negócios Estrangeiros adjunto, pode ter sido uma verdadeira jogada de mestre por parte do governo Tsipras. Tal como no xadrez, as negociações a nível internacional não se resolvem à primeira jogada, sendo obrigatório pensar de forma adiantada não apenas nos nossos movimentos, mas sobretudo nos movimentos do adversário.

Varoufakis é um especialista da teoria de jogos. Num artigo que escreveu sobre o tema em 2008, refere que qualquer teoria sobre como ganhar uma partida de xadrez é de extrema importância para generais, almirantes e outros promotores de destruição. Ciente disso e receando ver-se numa situação de zugzwang – palavra, ironicamente, alemã que descreve a desvantagem criada com a obrigatoriedade de um movimento de peças, quando um não-movimento seria o ideal –, o governo Tsipras optou por um movimento surpresa. Após uma abertura de jogo agressiva, com a escolha do ANEL como parceiro de coligação e a irredutibilidade nas primeiras reuniões com os parceiros internacionais, a retracção verificada nos últimos dias pode ter sido uma jogada há muito planeada.

À semelhança da abertura do gambito do rei – bastante agressiva e raramente vista nos jogos de xadrez de alto nível – Alexis Tsipras, certamente em conluio com Varoufakis, pode ter sacrificado uma peça para ganhar uma vantagem preciosa. Os resultados, pelo menos no imediato, foram bastante positivos: a bolsa de Atenas ganhou 4,37% e as yields de curto, médio e longo prazo caíram. Os mercados parecem gostar do facto de o ministro das finanças, a quem, pela sua intransigência, atribuem a responsabilidade pelos falhanços nas negociações da passada semana, ter deixado de ser o seu único interlocutor. Este é também mais um sinal de compromisso e de boa vontade demonstrado pelo governo grego e que poderá facilitar a assinatura de um acordo benéfico para o país. Por seu lado, os cidadãos gregos parecem também estar cada vez mais desejosos que tal acordo seja uma realidade, sendo que mais de metade prefere um acordo à rejeição de um compromisso.

Portugal precisa da Grécia. O que acontecer nos próximos meses em Atenas, será decisivo para o futuro de Lisboa. Com eleições em menos de seis meses, a já anunciada coligação PSD-CDS beneficiaria tanto de um fracasso das negociações internacionais com a Grécia como de uma melhoria dos indicadores económicos em Portugal. Não é pois de estranhar a linha dura e intransigente com que Passos Coelho, com a sua visão sempre e apenas imediatista, tem tentado bloquear os esforços gregos para um compromisso a nível europeu. No xadrez, o fundamental é ganhar e pouco importa o número de vezes que se está em cheque. Esperemos, pelo bem da Grécia, de Portugal e da Europa, que Tsipras tenha a estratégia perfeita e que, mesmo perdendo peças pelo caminho, consiga dar o mate.

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