Segurança e liberdade

Quando se assinala 1 ano desde o ataque ao Charlie Hebdo e ainda na ressaca dos atentados de dia 13 de novembro em Paris, as questões de segurança e liberdade estão no topo da agenda europeia. O equilíbrio entre estes dois elementos é e será sempre muito delicado e não são raros os casos em que uma sociedade assustada admite (ou aceita tacitamente) perder alguma liberdade em troca de mais segurança. A disponibilidade dos cidadãos em aceitar medidas restritivas à sua liberdade é tão maior quanto maior e mais próximo tiver sido o evento extremo causador do choque. Esta estratégia, que pode ser equiparada ao jargão militar shock and awe, permite que líderes democráticos façam aprovar leis que, de outro modo, não conseguiriam.

Para além dos dois ataques terroristas em Paris, 2015 ficará também marcado pelo enorme fluxo de refugiados vindos sobretudo de uma Síria dilacerada por anos de guerra civil. À inação dos líderes da Europa central (honrosa exceção feita a Angela Merkel) junta-se o populismo de alguns líderes da Europa de Leste. Num continente onde há pouco mais de 20 anos se derrubavam muros limitadores da liberdade, voltam agora a erguer-se novos muros, igualmente vergonhosos e igualmente limitadores da liberdade. Fala-se em voz alta em “proteger uma Europa cristã” e em evitar uma “invasão”. Pede-se o final do espaço Schengen apontado pelos nacionalistas de diversas origens como o pecado capital europeu e principal responsável pelos ataques terroristas em solo europeu. O facto de a grande maioria dos terroristas conhecidos ter nascido – e, mais importante, ter sido criada – nesses mesmos países parece não ter qualquer importância nesta discussão.

Em França, onde as questões relacionadas com a segurança interna estão na ordem do dia, o debate tem passado pelo modo como se pode repreender aqueles que cometem atos terroristas. Pouco se discutem estratégias de prevenção a curto, médio e longo prazo que embora possam ter um efeito menos positivo junto da opinião pública, serão certamente mais eficazes. Nesta linha, logo no dia 16 de novembro, o presidente da República francesa anuncia no Congresso que irá propor uma revisão constitucional de modo a que os cidadãos bi-nacionais possam perder a nacionalidade francesa em caso de condenação por terrorismo, havendo também quem defenda que essa punição deva ser alargada a cidadãos exclusivamente franceses. Se a aprovação do estado de emergência durante 3 meses se fez quase sem votos contra, esta nova proposta, certamente cara aos setores da direita radical, está a levantar mais questões entre os socialistas. Apesar disso, François Hollande parece decidido em avançar com a proposta.

O medo é um terreno fértil para a extrema-direita.  A ameaça do racismo, da xenofobia e do controlo das liberdades, direitos e garantias dos cidadãos é real. Viktor Órban na Hungria, Robert Fico na Eslováquia e o novo governo polaco são a prova de como o populismo nacionalista continua bem vivo. Em França é a Frente Nacional de Marine Le Pen que melhor representa essa ideologia. A esquerda, que deveria ser capaz de apresentar alternativas de modo a combater o nacionalismo, é por vezes um aliado útil da extrema-direita, chegando até, com fins eleitoralistas, a ser a responsável por medidas dignas de qualquer partido ultra-nacionalista, como se viu em França em relação à lei da retirada da nacionalidade aos cidadãos bi-nacionais. Neste caso, Hollande parece esquecer-se um princípio básico: os cidadãos preferirão sempre o original à cópia.

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