A publicação há uns dias do Estado da Educação 2014 é de saudar, uma vez que nos traz dados atualizados para conhecer melhor o sistema educativo português, fazer um balanço das políticas recentes e discutir orientações para o futuro. Só é de estranhar que o Conselho Nacional de Educação o torne público quase no final do ano de 2015 e passado o processo eleitoral, tanto mais que as edições de 2010 e 2011 foram publicadas no ano a que se referiam e as edições ulteriores, “repescando” grande parte dos dados e da estrutura, foram sofrendo atrasos cada vez maiores. Mas adiante: o que nos traz este relatório de novo?
Em termos da caracterização do sistema educativo, observa-se uma estabilização, mas que nivela por baixo, no sentido em que a enorme contração do sistema em 2012 e 2013 apenas se atenuou em 2014, mas sem sinais de inversão.
Desde logo, confirma-se o eclipse da educação de adultos (para números até inferiores a 2005, quando era pouco mais do que residual), o que faz com que o número total de diplomados dos ensinos básico e secundário se mantenha em queda abrupta desde 2010. O governo começou por destruir as Novas Oportunidades, denegrindo os seus profissionais e formandos. E depois não criou nada para o seu lugar, condenando à desqualificação grande parte da população adulta portuguesa.
Na educação das crianças e jovens os números não são tão alarmantes, até porque a queda das taxas de natalidade e a imigração juvenil fez diminuir o número de estudantes, sem decréscimo das taxas de frequência, e o desemprego faz com que a escola seja efetivamente o único espaço de integração para muitos jovens, mas o envelhecimento galopante do corpo docente mostra bem a tendência de contração e incapacidade de renovação do sistema. Em 10 anos, o corpo docente dos ensinos básico e secundário reduziu-se para 2/3 e existem hoje 29 docentes com mais de 50 anos para cada docente com menos de 30.
Por seu lado, o relatório coloca um enfoque grande nos resultados, mas que confirmam o saldo medíocre da administração Crato. As taxas de retenção aumentaram, logo desde o 1º ciclo do ensino básico, entre 2011 e 2014, provocando atrasos no percurso escolar de muitos milhares de jovens. E enquanto esperamos pelos resultados do PISA 2015, o relatório volta a mostrar que os avanços em termos dos desempenhos dos estudantes portugueses nas provas de matemática, português e ciências ocorreram nos períodos 2000-2003 e 2006-2009, em ambos os casos pela mão de governos socialistas.
É certo que o abandono escolar precoce tem vindo a diminuir, sobretudo devido ao crescimento exponencial dos cursos profissionais, mas faltam ainda dados e sobram dúvidas quanto à qualidade destes cursos e as oportunidades que efetivamente geram, seja de integração qualificada no mercado laboral, seja de prosseguimento de estudos. Um ministro tão afoito em medir taxas de empregabilidade, no caso da Iniciativa Novas Oportunidades, não demonstrou igual urgência no caso dos cursos profissionais.
Uma nota final. O relatório preocupa-se em realçar que não houve um aumento exponencial, nem do financiamento público, nem do número de alunos no ensino privado. Basicamente, o número de estudantes manteve-se estável e os apoios públicos até diminuíram (sobretudo em 2011), o que contraria os maiores receios acerca da orientação privatizadora do executivo PSD/CDS.
Contudo, não devemos esquecer que a liberalização do apoio público às escolas privadas foi consagrado na lei, deixando de se limitar a situações de escassez de oferta pública, o que abriu a porta para que tal transformação ocorra, logo que exista viabilidade económica, pois é claramente uma política com custos avultados, pelo menos, na fase de implementação. Essa intenção foi, aliás, anunciada (e adiada) sucessivas vezes pelo governo. Além disso, o que dizia o Memorando da Troika, numa das únicas três alíneas sobre políticas educativas, era que a racionalização do financiamento às escolas privadas era uma estratégia fundamental para a redução do orçamento educativo para a educação. Ou seja, com as melhorias da rede pública e a redução do número de crianças e jovens, já seria possível integrar quase todos em escolas públicas, reduzindo os contratos com escolas privadas.
Relatório completo em: http://www.cnedu.pt/pt/publicacoes/estudos-e-relatorios/estado-da-educacao