Renováveis? Sim, obrigado!

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Há exactamente quatro anos, o mundo assistia àquele que foi um dos maiores sismos jamais registados. Com epicentro ao largo do Japão, o sismo e consequente tsunami teve um impacto devastador sobre o país, tendo como uma das principais consequências a destruição parcial da central nuclear de Fukushima, naquele que foi o pior acidente nuclear desde Chernobil e que obrigou à evacuação de várias dezenas de milhar de pessoas, provocando impactos ainda por determinar na saúde dos cidadãos expostos à radiação, bem como dos diferentes ecossistemas, terrestres e marinhos. A necessidade de produção energética é uma evidência, como também o é o facto de o ser humano ser o grande responsável pelas alterações climáticas que, em grande parte, são resultado da produção e consequente consumo de energia. O nuclear, não apenas por razões de segurança, bem como fontes de energia mais ou menos convencionais, como o petróleo ou o gás de xisto não me parecem ser a alternativa. Precisamos de uma aposta séria na produção de energia a partir de fontes renováveis, que possa responder às necessidades globais e que contribua o mínimo possível para as alterações climáticas.

A União Energética é uma das principais apostas da actual Comissão Europeia. Após um Conselho Europeu onde foi aprovada a estratégia Energia e Clima 2030 e que, muito por influência dos grupos de pressão franceses a favor do nuclear, ficou aquém das espectativas no que à interligação das redes energéticas diz respeito, urge definir metas vinculativas de interligação das redes, nomeadamente da península Ibérica a França. Paralelamente, deve apostar-se num plano de promoção das energias renováveis, tanto a nível nacional, como a nível europeu, podendo o financiamento ser obtido através de um Green New Deal europeu. Note-se que têm sido dados alguns passos no sentido de responder a estas necessidades. Passos, Rajoy, Hollande e Juncker reuniram-se recentemente em Madrid para discutir a interligação energética entre a península Ibéria e França e, em Outubro do ano passado, foi finalmente publicado o decreto-lei que regula a microgeração eléctrica, para autoconsumo e/ou venda à rede. O apoio à produção de electricidade para autoconsumo é um passo fundamental para a promoção das fontes de energia renovável, neste caso a solar. Está também iminente o fornecimento de electricidade de origem renovável por parte de uma cooperativa que, actualmente, já permite investir na instalação de painéis solares. São passos na direcção certa e que devem ser continuados.

Portugal está relativamente bem posicionado no que à produção de electricidade a partir de fontes renováveis diz respeito. Aparecendo recorrentemente nos lugares cimeiros dos países com maior produção eléctrica a partir de fontes renováveis, Portugal tem conseguido gerar mais de metade da energia eléctrica que consome a partir dessas fontes. Se já há indicação que a energia eólica (em terra) pode estar a chegar ao limite de capacidade de exploração, existe ainda um enorme potencial noutras formas de produção, nomeadamente solar, biomassa, das ondas e eólica ao largo da costa, o que representa também um grande potencial de criação de postos de emprego. O consumo de combustíveis fósseis pode também ser reduzido através da aposta numa mobilidade urbana mais sustentável (e.g. passes de transportes a preços reduzidos e incentivo do uso de bicicleta) e na promoção dos veículos movidos a electricidade.

A luta por um país e um planeta mais sustentáveis, que aposte na produção de energia a partir de fontes renováveis, deve ser comum a todos os que defendem um futuro melhor. Mais do que simples espectadores, é necessário que cada um de nós se torne num agente de mudança e que reclame os seus direitos de cidadania, exigindo que os seus governos apostem em políticas de desenvolvimento sustentável. Nos anos oitenta, em Portugal, ficou famosa a frase de oposição ao nuclear – “Nuclear, não obrigado”. Agora, é chegado o tempo de propor o caminho que queremos percorrer e dizer que sim, queremos mais renováveis, sim, queremos um planeta sustentável.

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Por um Green New Deal Europeu

A saída da crise que o continente europeu atravessa deve fazer-se em duas fases. Em primeiro lugar, é essencial a rejeição da austeridade cega, que tem no tratado orçamental um dos seus expoentes, e que mais não tem feito que contribuir para o aumento das desigualdades e da pobreza, tendo também, como efeito secundário, o aumento do sentimento anti-europeísta. Seguidamente, é necessário um plano ambicioso e sério de relançamento dos países da União. Tal plano faz muito mais sentido à escala europeia e deve, forçosamente, desafiar alguns dos paradigmas actuais, devendo a esquerda europeia ter um papel de destaque na sua concepção. Que formato poderá então ter tal programa?

A principal resposta à grande depressão americana foi o New Deal do presidente Roosevelt, apresentado em 1933 e que, de modo muito sintético, consistia numa série de programas de investimento e criação de emprego, levados a cabo por diversos organismos públicos. Se é verdade que a simples cópia do modelo americano de 1933 não faria sentido na Europa em 2015, é também verdade que há muitos pontos em comum no diagnóstico da crise, pelo que haverá também muitos pontos em comum na solução e consequente relançamento das economias europeias. Um New Deal renovado, à escala europeia e assente em princípios de sustentabilidade ecológica e social, apresenta-se como uma alternativa e um caminho que deve ser seguido para ajudar a Europa a sair da crise em que se encontra.

Num planeta de recursos finitos, não faz sentido fazer do crescimento económico o alfa e o ómega das políticas públicas e nem este pode ser visto como indispensável. A transição para uma sociedade que tenha como objectivo o aumento da prosperidade em lugar do crescimento económico pode, no entanto, fazer-se tendo fases de crescimento (verde) que deverão preparar os países para a não dependência desse mesmo crescimento. No caso português, em que se poderia traduzir um Green New Deal? Há três áreas essenciais e prioritárias e sobre as quais este plano se deveria debruçar:

  1. Alimentação/Agricultura e pescas: Em relação à agricultura, devem ser criados planos de incentivo à agricultura biológica, em oposição à agricultura intensiva, responsável por enormes impactos ambientais. Devem também ser melhorados os apoios à agricultura cooperativa e familiar, que representa o meio de subsistência de muitas famílias sendo, muitas vezes, o único garante contra a pobreza. Estes investimentos promoveriam a fixação da população no interior do país e contribuiriam para o aumento da segurança alimentar nacional e europeia.
    Portugal tem uma das maiores zonas económicas exclusivas da Europa, da qual não tira todo o benefício possível. Para além da frota pesqueira nacional, também o modo como olhamos o oceano deve ser renovado. O número de reservas marinhas, bem como as áreas protegidas, deve ser aumentado, de modo a garantir-se a renovação dos stocks de pesca. A “economia azul” pode também ser ajudada através de uma aposta na investigação científica, área na qual Portugal pode tornar-se uma referência a nível mundial.
  2. Transição energética: O investimento na produção de energia através de fontes renováveis deve ser continuado. O Estado deve assegurar a transição energética de combustíveis fósseis para fontes renováveis, dando os incentivos necessários. A microgeração descentralizada deve ser incentivada, de modo a que cada cidadão possa ser um produtor de energia. Sendo um plano a nível europeu, Portugal deve voltar a insistir na promoção de uma rede eléctrica europeia, de modo a que a electricidade produzida a partir de fontes renováveis na península ibérica possa chegar ao centro da Europa. Para tal, será necessário definir metas vinculativas para a interligação das redes nacionais.
  3. Reabilitação urbana: O sector da construção civil foi dos mais afectados com a crise, atirando centenas de pessoas para o desemprego. Paralelamente, as principais cidades portuguesas têm os seus centros urbanos abandonados, sendo inúmeros os edifícios devolutos. Os edifícios portugueses têm também registos de eficiência energética muito baixos. Sabendo-se que, a nível europeu, os edifícios são responsáveis por 40% do consumo energético e 36% das emissões de CO2, existe aqui uma excelente oportunidade para reabilitar os centros urbanos, bem como para promover o aumento da eficiência energética nos edifícios portugueses e europeus, contribuindo para melhorias não apenas a nível ambiental, mas também a nível de custos com aquecimento e arrefecimento.

Um Green New Deal europeu é a resposta adequada para o relançamento da Europa após a crise. Os Estados, tanto pelo investimento público, como pela capacidade legislativa, têm um papel preponderante a desempenhar. A contratação pública verde pode ter um papel fundamental na transição para uma sociedade mais próspera. Basta de austeridade cega e de políticas imediatistas. É chegado o momento de pensar em políticas a médio e longo prazo, que criem empregos sustentáveis e que permitam que a Europa se volte a levantar, mas que o faça de modo ecológica e socialmente responsável.